quinta-feira, 2 de junho de 2011

AMOR, VERDADEIRO AMOR


por José Ricardo de Souza*

Procura-se um amor sereno e verdadeiro. Quem poderá encontrá-lo numa sociedade erotizada, como a nossa, onde a busca do afeto foi substituída pela busca do prazer sexual, a ternura pela carícia, e o dialogo pelo sexo fácil e fortuito ? As roseiras estão repletas de flores, pois faltam apaixonados para colhê-las e oferecê-las, e ninguém mais apela para a singeleza romântica. Os banquinhos das praças estão vazios, e não se vêem mais casais de enamorados; que abraçados faziam as mais belas juras e declarações de amor; enquanto isso, nos motéis lotados, sobram luxúria e devassidão. Entre um coração apaixonado e um momento de prazer, as pessoas preferem satisfazer aos instintos do corpo, mesmo que depois, sintam a alma vazia e abandonada, pois sem amor, o sexo perde o seu sentido.

Infelizmente, acabamos transformando, e por que não sendo transformados, em objetos descartáveis e descartados, inseridos numa lógica insensível aos apelos do amor, que teima em virar poesia, e tirar da vida a melodia mais bela, a que fala do sentimento mais profundo. Se falta a inspiração para cantar o amor e demonstrar ao mundo sua plenitude, culpem as novelas, os filmes, as revistas, algumas danças e certas músicas, que apelam para a vulgaridade, investem na banalização do erotismo, transformando a pornografia numa atitude natural e tolerável. Após a liberação da sexualidade, quem acabou perdendo não foi a Igreja, sempre acusada de retrógrada nesses assuntos, nem a moral, pois ética e respeito são e sempre serão conceitos universais em qualquer sociedade; sobrou, então, para a família, para a sociedade, enfim para a nossa juventude, perdida entre atender ao encantamento arrebatador de uma paixão honesta ou ceder ao consumismo erótico imposto pela mídia e por alguns pseudo-psicológos e falsos educadores.

Uma vez livres para o ato sexual, o ser humano acabou prisioneiro dos seus próprios desejos, perdeu o discernimento para descobrir a grandeza de uma paixão, trocou a paz serena de um carinho pela malícia das carícias mais íntimas. Enfim, ousou demais, mas amou de menos. Confundiu os dois conceitos, afetividade e sexualidade, sem saber separá-los, e por isso perdeu uma oportunidade ímpar de crescer pessoal e espiritualmente. O resultado disso, está aí, às claras, quando sabemos que ninguém mais quer namorar, noivar ou mesmo casar, se é mais simples "ficar" com alguém numa noite, depois com outro, e mais outro, até que apareçam a gravidez precoce, as doenças sexualmente transmissíveis, a depressão, o vazio, e o pior de todos os males de quem brinca com o sentimento: a solidão.

A indústria da pornografia, a mesma que incentiva a prostituição (inclusive a infantil), e que movimenta milhões de dólares em todo o mundo, já desempenhou (bem) o seu papel de deturpar a natureza do amor puro e singelo. Cabe a nós, que ainda acreditamos no afeto, reafirmarmos a importância dos sentimentos amorosos, antes que seja tarde demais, e ninguém mais tenha a coragem de amar, o que seria o fim de um dos sonhos mais sublimes do ser humano, que é o de procurar alguém que o complete, que o realize como pessoa, que seja capaz de proporcionar-lhe momentos inesquecíveis, de pura magia e poesia. Nada poderá substituir a ternura mais cândida, nem mesmo a melhor das fantasias sexuais, porque o amor é maior, e é o único meio possível de construir a felicidade, de vencer toda e qualquer dificuldade, pois supera-se a cada gesto de aconchego, em cada palavra sincera, em cada sorriso de esperança, e faz de um rápido instante um século de paz.

Ainda que leve toda uma vida, fará sempre sentido, buscar o amor verdadeiro, mesmo que se erre um pouco nas nossas escolhas, e que as lágrimas escorram dos olhos de quem foi traído ou abandonado, e que surjam dificuldades como o ciúme, a incompreensão e a intolerância; tudo isso faz parte do jogo do amor. O importante é nunca desistir, jamais deixar de acreditar, manter sempre acesa a chama da esperança, e contar os dias e os minutos para o grande encontro de duas vidas, que se transformarão em apenas uma, enlaçadas pelo arrebatamento de um grande amor. Não fomos feitos para à solidão, todos nós temos o direito à companhia de quem amamos, mesmo que seja numa bonita lembrança, que com o passar dos tempos, virou saudade.

Amar é aceitar o desafio de abandonar a si mesmo, e buscar no outro, algo a mais do que uma sucessão de carinhos e carícias. Se alguém conseguir penetrar nesse mistério profundo, talvez entenda porque a sexualidade precisa do amor, embora o amor dispense o sexo, em algumas circunstâncias. Vai aprender que a emoção de um beijo apaixonado jamais substituíra as noites mais licenciosas. Descobrirá que enquanto houver amor sincero, sereno e verdadeiro, a humanidade terá sempre uma nova chance para repensar sua existência e recomeçar a cada dia de uma maneira diferente de compreender as coisas do corpo e as coisas do coração. Verá que andam juntas, mas são coisas distintas, cada qual tem o seu momento certo, e se manifestará espontaneamente, desde que o ser humano aprenda a respeitar o rumo natural do amadurecimento psíquico e social. Somente assim, seremos capazes de vivenciar cada momento de amor, como se fosse o primeiro, o único e o mais importante de toda a nossa existência. Ame e deixe-se amar, mas nunca duvide da força de uma grande paixão, que sempre teima em ser eterna e singela, para sempre.

* O autor é historiador, professor e escritor; membro da Academia de Letras e Artes da Cidade do Paulista.

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